A hora no portão

domingo, 8 de agosto de 2010

Aquela hora no portão fica cada vez mais difícil. Aquele nó na garganta que insiste em se fazer notar. É que o tempo passa tão rápido quando estamos juntos. É tão pouco tempo pra absorver o outro. Os olhos marejados, a voz embargada. Nada de muitas despedidas. Nós não somos bons nisso. Nos rostos de quem fica, as marcas do tempo são suavizadas pela certeza do dever cumprido. A mesma certeza que ameniza a dor por tantas despedidas, e tantas outras que ainda estão por vir. A certeza de que eles vieram ao mundo pra "voar", mas sempre voltarão pro lugar seguro. E aqueles que ficam, estarão sempre ali, de braços abertos. Porque por trás daquele portão, que mudou de forma e de cor com o passar do tempo, que já viu tantos abraços emocionados, tantas chegadas e tantas partidas, existe o amor na sua forma mais sublime. O amor construído a cada dia, ao longo de muitos anos. Nos rostos de quem vai, o silêncio de quem tem que ir, mesmo a contra gosto. Mesmo com aquela vontade enorme de ficar. A saudade, instalada permanentemente, se rebela. Apodera-se de todo o corpo antes do carro virar a primeira esquina. Aqueles que partem, cada um vai pra um lado. É que a vida tem dessas crueldades. Ela nos obriga a crescer e escolher. E mais uma vez é a certeza que ameniza a dor. A certeza de sempre poder voltar. Porque ali está toda a nossa vida. Porque ali estão guardados os sucos de groselha e de tamarindo, tão intragáveis, que hoje nos rendem boas risadas. Ali estão guardados os cachorros que corriam atrás de mim, quando eu ía comprar leite na rua de trás. A vez em que Gigio esfolou o queixo. As duas vezes, aliás. A vez em que Thiago atolou na lama, com a bicicleta, em meio ao trânsito de uma avenida em construção. Ali estão guardados nossos primeiros passos, nossos primeiros versos, nossos primeiros amores, nossas brigas de moleques, nossos bichos de estimação, que nunca duravam muito - os passarinhos mainha deixava fugir, nossas brincadeiras no quintal, na rua, o futebol na garagem, a macarronada da minha mãe, o assobio característico do meu pai, a buzina pra abrir o portão. É isso que ameniza a saudade. É lembrar de tudo de um forma tão gostosa. É saber que sempre teremos as reuniões na cozinha, em volta da mesa. É saber que qualquer que seja o caminho, cada um de nós carrega um pouquinho que seja do outro.
Hoje, ver Lívia balançando a maõzinha, enquanto o carro partia, deixou meu coração tão apertado. E ao mesmo tempo feliz, por saber que ainda teremos muitas despedidas, porém ainda mais outros tantos reencontros.

"Não desesperas com o banzo
e nem fique entristecido
se a estrada é nossa sina
se a distância é o destino
lembra-te que é na saudade
que o poeta encontra abrigo".

Thiago Simões Feitosa 08-08-2010

Ele enviou essa poesia na hora em que eu estava escrevendo o texto acima.

3 comentários:

maria da guia disse...

Lindo! li com seu pai. ficamos emocianados.Como é bela a nossa família!Beijos.Te amamos

Katita disse...

Ahhh!! Assim eu choro!
:)

EU disse...

Emocionante!!!